sexta-feira, 16 de julho de 2010

Cotidiano

O sol foi surgindo gradualmente e os meus olhos passaram a se comprimir na mesma medida. Era o peso da luz acordando o meu sono.
Observei as cortinas que eram movidas pelo vento que apagava a fumaça saída da tua xícara e o som uniforme dos grilos foi se esgotando. Me lembrei de como costumava reproduzir esse mesmo som quando o silêncio se instalava depois de uma das suas perguntas impetuosas. Mas pela manhã a calma impera.
Eu me sentia tão esmagada que meus ossos gritavam por socorro, mas apesar de parecer que eu havia corrido uma maratona a minha dor não havia sido causada pelo esforço físico. Era uma dor prazerosa. Era felicidade, porque eu sobrevivi à mais uma noite com você, fazendo com que pela manhã só restasse a tua voz rouca, vencida pelo cansaço, e duas mãos inquietas que se movimentavam num esforço inútil, tentando explicar o inexplicável. Acho que Wayne Coyne estava com a razão no rádio do táxi que me levou até você pela primeira vez. Cheguei a pensar que todos os poemas, padrões e raças cujo mundo foi tragado pelo mar, de Neil Gaiman, não faziam o menor sentido porque você deixava o mundo todo azul-celeste quando torcia os lábios, lutando contra o seu melhor sorriso: o que teima em se abrir quando me chama pelo nome.
O sol brilhou mais forte e meus olhos se fecharam por alguns segundos. Sua respiração se tornou mais pesada e próxima. Perto de você o planeta é uma pequena ilha.
E assim se passou um quarto da manhã.

domingo, 11 de julho de 2010

Dois

(Foto descaradamente roubada do Páginas Viradas)

Ela usou o vestido como se fosse sábado, como se fosse verão, como se tivesse recebido flores pela manhã.

Ele segurou as mãos dela como se fossem um mistério e achou difícil acreditar: ainda bastava que ela caminhasse ao lado.

Eles subiram uma colina e descobriram que tinham algo a dizer. Era dia de matar. Deixaram a noite cair sem que se ouvisse um só som. Começaram a escorregar.

O tempo correu, o dia acabou, os segredos estão lacrados.

Agora jogue a moeda, marque a hora, deixe chover. Não importa, o mundo acabou.

Mãos sempre são mistérios.

(Totalmente baseado em Jack and Jill - Katie Herzig)

quinta-feira, 1 de julho de 2010

Parei

Decidi parar de pensar. Decidi parar de pensar e de falar. Depois ainda estabeleci metas: acordar mais cedo, comer mais cenoura, dar bom dia à vizinhança, ouvir menos Coldplay e tomar mais leite.
Chega de ficar imaginando como ele chegaria pra me dizer "e aí? tudo bem? eu te amo!"
Pra quem sempre preferiu voar, recolocar os pés no chão é uma dádiva. Preciso manter contato com a terra - só pra variar.
Penso que enquanto eu fico achando que o sorriso dele é tão lindo que poderia iluminar uma cidade inteira, eu poderia cuidar mais do meu.
Necessito desesperadamente de alegria. Ou melhor, alegria não: euforia! Quero voltar a ler, quero dar risada do sarcasmo do House, quero assistir "Casablanca" sem sentir que me falta algo, quero andar por aí no fim da tarde só porque assim eu me sinto mais parte do universo. Aliás, por que diabos eu não olho mais pros ipês da esquina de cima? Eu costumava fazer isso. O cheiro deles me lembra de como ter paz - e eu quero paz. Quero qualquer coisa que me faça voltar a dormir com aquele cansaço típico de quem foi feliz demais pra pensar em algo melhor depois que apoia a cabeça no travesseiro.

"Supere isso e, se não puder superar, supere o vício de falar a respeito", aconselhou Maryan Keyes, uma santa.