quarta-feira, 15 de setembro de 2010
Só a imortalidade explica
Os dicionários invariavelmente definem o substantivo “grêmio“ com uma só frase. Os mais tradicionais costumam afirmar que se trata de um “grupo de pessoas reunidas em torno de um mesmo objetivo”, o que torna tudo muito simples e didático, porém, insuficiente se falarmos do Grêmio Foot-Ball Porto Alegrense.
Para os que amam o manto azul, preto e branco, definir o Grêmio é uma tarefa árdua. O time pelo qual mais de sete milhões de corações torcedores batem por todo o país desafia a lógica e a racionalidade. Há quem diga que Grêmio é sentimento. Há quem diga que é doença. Há quem diga que é tudo e mais um pouco, porque pensar no tricolor gaúcho é pensar na imensidão.
O Grêmio nasceu em 1903. No mesmo ano morreu o pai de Hitler, nasceram George Orwell e Candido Portinari, as mulheres abusaram do tom pastel e a primeira versão cinematográfica para Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carroll, foi produzida.
Só nasci 88 anos depois e ainda levei mais quatorze anos para provar da imortalidade pela primeira vez. Quando se é criança, as coisas não fazem muito sentido. O que é uma partida de futebol? 22 homens correndo atrás de uma bola? Só pude compreender no dia em que 22 viraram 18.
Era 26 de novembro, fazia sol e a batalha acabara de começar. As camisas azul-celeste estavam todas lá cumprindo a promessa: com o Grêmio, onde estiver o Grêmio. A bola rolou e, se ficava por muito tempo nos pés do adversário, até ateu rezava. Todo mundo parecia implorar pra Deus ser gremista naquele dia. No campo os jogadores pareciam sufocados. Só não se sabia se era por causa do presente da casa - a tinta fresca com querosene e gasolina no vestiário - ou porque o campeão do mundo estava na segunda divisão.
A tarde foi marcada por duas penalidades máximas contra o Grêmio. A primeira foi parar na trave do goleiro Galatto. A segunda foi adiada por mais de 25 minutos pelos jogadores desesperados que guerreavam. Sandro, o capitão, parou em cima da marca do pênalti, tentando evitar o inevitável. Era final de segundo tempo e um gol do adversário condenava os gaúchos por mais um ano, mas o gol nunca foi marcado. Galatto defendeu dessa vez e Anderson ainda cuidou do placar. 1x0. O narrador gritava: “Inacreditável! Você acredita em milagres?”
O jogo que posteriormente ficou conhecido como “A batalha dos aflitos” só acabou aos 60 minutos do segundo tempo. O Grêmio, mesmo com quatro jogadores expulsos, foi campeão e até se poderia dizer que, nesse momento, voltou a ser grande, mas isso seria um erro: o Grêmio nunca se permitiu ser pequeno. Pelo contrário, nada pode ser maior. Meu coração passou a ter três cores.
Desse modo posso dizer que já nasci campeã do mundo. Portaluppi cuidou disso pra mim em ’83, quando eu ainda nem pensava em vir ao mundo. Hoje, me orgulho em torcer pelo time que completa 107 anos de glórias. Parabéns, imortal. Como diria o escritor gaúcho Felipe Sandrin, “é pequeno o detalhe de o meu sangue ser vermelho. Diante do céu e do mar, é azul o mundo inteiro”. Azul celeste.
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2 comentários:
Apesar de são-paulino, confesso que assisti a Batalha dos Aflitos ao vivo, num bar suspeito, e fiquei por alguns minutos estarrecido após o final do jogo.
Sei lá: em algum momento, todos os torcedores são um só.
Daniel Zanella
Acho incrível o poder que o futebol tem de nos envolver, de nos fazer vibrar, torcer, rir, chorar.
Um turbilhão de emoções em apenas 90 minutos.
Até hoje nao sei definir o que é essa paixão que nos move,independente da escolha pelo time.
É fantástico!
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