domingo, 30 de novembro de 2008

Pra você que já não tenho mais


Foi entre a poeira da varanda e o frio da calçada que a vi repetir sem consolo:

- Ainda podemos fugir!

Mas quem dera, não o fiz. Era covarde demais para fazê-lo. É: covarde mesmo! Porque nunca tive coragem de olhar pra mim como olhava ao redor. Pensava nas ciscunstâncias, nos sentimentos alheios, mas nunca em mim mesmo. O preço desse hábito foi vê-la partir. Meu coração se foi com o dela, que agora corria no meio da chuva, transtornada.

Ah, Se naquele momento eu pudesse prever que meu sorriso seria roubado e que sem ela só haveriam momentos de alegria e mais nada... Mas não previ.

Abri mão de mim mesmo e me vi envelhecer. Mas não de idade.
Hoje sou assim, só lembranças. Me vejo sorrir poucas vezes, nos fins de tarde em que minhas filhas caminham na minha direção. Nesses momentos, somente nesses momentos, sinto que fiz a coisa certa. Mas aquilo que pulsa dentro de mim ainda sente a falta dela.
Se passam os dias, os anos, e quando parece estar tudo bem o vento me traz aquela poeira de volta. Ela passa na minha frente e o meu corpo estremece. Ainda vejo naqueles os olhos tristes o frio da calçada, e quando a garganta começa a doer ouço o pedido:

- Volta!

Mas logo passa e lá se vai ela novamente, mais linda do que nunca.

Pudera eu parar o tempo naquele olhar...

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Sempre gostei do que me causava dor. Se não doía, eu não sentia. Tinha que ter os olhos comprimidos e o peito dilatado. Tinha que ter noites em claro, cansaço, perdas, drama - qualquer coisa que doesse. Quem não conhece a dor não conhece o alívio. Não sabe como é bom sentir esperança sendo renovada. É assim nos melhores livros: mais dolorido, mais bonito. O ar que eu respiro, por exemplo, não me seria tão válido se um dia eu não tivesse chorado para obtê-lo.

Doeu. Mas se não dói, não vale a pena. Para mim, simplemente não vale a pena.

terça-feira, 11 de novembro de 2008


(Pink Floyd - Wish you were here)


Somos apenas duas almas perdidas
Nadando num aquário
Ano após ano
Correndo sobre este mesmo velho chão
O que encontramos?
Os mesmos velhos medos.


(...) Queria que você estivesse aqui.

terça-feira, 4 de novembro de 2008

olhares.com


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Aqui, onde as cortinas silênciosas se movem com cautela ao comando do vento, eu poderia dormir sem sonhar. Eu poderia me jogar no sofá da sala e observar os móveis bem alinhados sem lembrar de você. Eu seria capaz de caminhar pelos quartos brancos - vazios como a minha alma - fechar os olhos e sentir o ar.
Eu viveria aqui, eu choraria aqui, eu observaria essas paredes pálidas todos os dias da minha vida se aquelas ruas úmidas ainda não guardassem teus passos. Eu morreria aqui, se não precisasse da vida pra sentir o sereno caindo sobre os meus cabelos desleixados e lembrar da tua respiração passando por eles. Eu estaria aqui para sempre se não me obrigasse a descer as escadas pra ver meu cigarro queimar sózinho na escuridão. Assim como por acaso o teu descaso fez com o meu coração.