Pra começar, dia de Gre-Nal, pra mim, é dia de GRE-nal. Além disso, é dia de final de copa do mundo, dia de parto, dia de formatura, dia de mentir e dia de leitura em público. Eu fico tremendo feito vara verde, como as unhas, soco os móveis e grito tanto quanto o meu irmão jogando truco.
Outro aspecto muito interessante sobre o GRE-nal, é o saudosismo que ele me desperta. Eu começo a me lembrar de quando tinha 6/7 anos e meu primo me fazia caminhar pela Água Verde com uma camisa do Grêmio. A camiseta era dele, então batia nos meus tornozelos e eu quase torrava no sol, mas ficava incrivelmente feliz. A minha felicidade era quase apalpável. Ainda é.
Quando o Grêmio faz um gol em dia de GRE-nal, eu me lembro da pequena e sorridente versão de mim. E eu não mudei muita coisa. O Grêmio ainda me orgulha (e aflige).
Sobre isso, há quem diga que eu vou infartar. Dizem que é muita aflição e eu não tenho coração suficiente pra isso. A teoria é boa, mas a metáfora é ruim. Se eu infartar, é porque tenho coração demais. Pro meu Imortal, meu coração é infinito.
segunda-feira, 25 de outubro de 2010
quarta-feira, 20 de outubro de 2010
Para refletir:
O senhorzinho está sentado na minha frente. Ele tem 66 anos e uma pele quase negra - resultado de muitos anos de exposição ao sol. Enquanto fala, brinca com o menininho que não pára quieto no colo da mãe. Está de camisa branca e boné de campanha. Tem olhos frágeis e gosta de falar da vida.
De repente, divaga:
- Eu tenho uma casa própria, um carrinho, um casal de filhos e aposentadoria. Eu tive muita sorte... Muita sorte!
E aí, senhoras e senhores, eu penso: O que é que eu estou fazendo mesmo?
De repente, divaga:
- Eu tenho uma casa própria, um carrinho, um casal de filhos e aposentadoria. Eu tive muita sorte... Muita sorte!
E aí, senhoras e senhores, eu penso: O que é que eu estou fazendo mesmo?
domingo, 17 de outubro de 2010
Tudo pela metade
Eu admiro o que não presta. Eu escravizo quem eu gosto. Eu não entendo. Eu trago o lixo para dentro. Eu abro a porta para estranhos. Eu cumprimento. Eu quero aquilo que não tenho. Eu tenho tanto a fazer. Eu faço tudo pela metade. Eu não percebo. Eu falo muito palavrão. Eu falo muito mal. Eu falo muito mesmo sem saber o que estou falando. Eu falo muito bem. Eu minto.
Marisa Monte
Marisa Monte
terça-feira, 12 de outubro de 2010
João e Maria
Maria nasceu atrás de uma estação ferroviária. Enquanto a mãe gritava, o trem apitava. Anos depois, sentou-se no último vagão e terminou de ler Cem Anos de Solidão. Irrompeu em um choro sofrido. Pegou o espelho de bolso pra ver por onde o rímel escorria e, enquanto contornava os olhos com os dedos, viu João.
João era alagoano e tinha pele de castanha do Pará com casca. Sempre que tomava banho, cantava Belchior. Se dava bem com a vizinhança e era feito de camisas brancas, cabelos penteados e sorrisos baixos. Quando dizia “oi”, parecia querer dizer que sentia muito. Sentado sozinho na mesa, tomava um café e fitava Maria de costas, por cima da xícara.
Quando perceberam que haviam se notado, pularam das cadeiras. João queimou os lábios e derrubou o café na toalha branca. Maria derrubou o espelho, que se partiu em dez no chão, e deixou o batom vermelho escorregar.
João, nervoso, gaguejou em pensamento e seguiu na direção de Maria, segurando o tubo cor de sangue. Parando ao lado da mesa, viu a moça que ainda juntava cacos e segurava a saia que teimava em voar com o vento.
Sorriram. Falaram-se com olhares e acenos. A piscadela de Maria disse: "muito obrigada". João entendeu e lhe estendeu a mão. A partir daí, passaram a dividir a mesa, a toalha manchada de café e sete anos de sorte.
João era alagoano e tinha pele de castanha do Pará com casca. Sempre que tomava banho, cantava Belchior. Se dava bem com a vizinhança e era feito de camisas brancas, cabelos penteados e sorrisos baixos. Quando dizia “oi”, parecia querer dizer que sentia muito. Sentado sozinho na mesa, tomava um café e fitava Maria de costas, por cima da xícara.
Quando perceberam que haviam se notado, pularam das cadeiras. João queimou os lábios e derrubou o café na toalha branca. Maria derrubou o espelho, que se partiu em dez no chão, e deixou o batom vermelho escorregar.
João, nervoso, gaguejou em pensamento e seguiu na direção de Maria, segurando o tubo cor de sangue. Parando ao lado da mesa, viu a moça que ainda juntava cacos e segurava a saia que teimava em voar com o vento.
Sorriram. Falaram-se com olhares e acenos. A piscadela de Maria disse: "muito obrigada". João entendeu e lhe estendeu a mão. A partir daí, passaram a dividir a mesa, a toalha manchada de café e sete anos de sorte.
segunda-feira, 4 de outubro de 2010
Velho Amor
Pensou quatro vezes antes de virar a esquina. Chegou a contar nos dedos pra não se arrepender depois. Um, siga em frente. Dois, acabou. Três, vai doer. Quatro, é proibido gritar.
Continuou caminhando firme, olhando apenas algumas vezes para trás. O prédio branco foi diminuindo. O céu cinza foi aumentando. O peito ficou tão encharcado que já não sabia mais se chovia do lado de dentro ou do lado de fora.
Sentou-se no meio fio e pegou o bloquinho de notas. Fez um emaranhado de linhas fortes, quase rasgando o papel. Rabiscou bem fundo: nunca mais, nunca mais, nunca mais.
Arrancou o moletom do corpo tentando se livrar do cheiro acusador. Fechou os olhos e inspirou infinito. Pediu por novos ares, novo corpo, nova vida. Se lembrou do livro favorito e soube que era mesmo alagoana. Só sabia chover.
Mais tarde pegaria um táxi, subiria as escadas e giraria a chave. Desfilaria pelo apartamento vazio, ligaria o chuveiro, a água escorreria pela pele e lavaria a alma. Sairia envolta pelo vapor e abriria a porta. Ele estaria lá. Seus olhos estariam tão transbordantes que a fariam chorar outra vez.
Mesmo seca, choveria de novo. Compraria um bloquinho e outro moletom. Novas roupas, mesmo cheiro. Mesmos hábitos, velho amor.
Continuou caminhando firme, olhando apenas algumas vezes para trás. O prédio branco foi diminuindo. O céu cinza foi aumentando. O peito ficou tão encharcado que já não sabia mais se chovia do lado de dentro ou do lado de fora.
Sentou-se no meio fio e pegou o bloquinho de notas. Fez um emaranhado de linhas fortes, quase rasgando o papel. Rabiscou bem fundo: nunca mais, nunca mais, nunca mais.
Arrancou o moletom do corpo tentando se livrar do cheiro acusador. Fechou os olhos e inspirou infinito. Pediu por novos ares, novo corpo, nova vida. Se lembrou do livro favorito e soube que era mesmo alagoana. Só sabia chover.
Mais tarde pegaria um táxi, subiria as escadas e giraria a chave. Desfilaria pelo apartamento vazio, ligaria o chuveiro, a água escorreria pela pele e lavaria a alma. Sairia envolta pelo vapor e abriria a porta. Ele estaria lá. Seus olhos estariam tão transbordantes que a fariam chorar outra vez.
Mesmo seca, choveria de novo. Compraria um bloquinho e outro moletom. Novas roupas, mesmo cheiro. Mesmos hábitos, velho amor.
Assinar:
Postagens (Atom)