Pensou quatro vezes antes de virar a esquina. Chegou a contar nos dedos pra não se arrepender depois. Um, siga em frente. Dois, acabou. Três, vai doer. Quatro, é proibido gritar.
Continuou caminhando firme, olhando apenas algumas vezes para trás. O prédio branco foi diminuindo. O céu cinza foi aumentando. O peito ficou tão encharcado que já não sabia mais se chovia do lado de dentro ou do lado de fora.
Sentou-se no meio fio e pegou o bloquinho de notas. Fez um emaranhado de linhas fortes, quase rasgando o papel. Rabiscou bem fundo: nunca mais, nunca mais, nunca mais.
Arrancou o moletom do corpo tentando se livrar do cheiro acusador. Fechou os olhos e inspirou infinito. Pediu por novos ares, novo corpo, nova vida. Se lembrou do livro favorito e soube que era mesmo alagoana. Só sabia chover.
Mais tarde pegaria um táxi, subiria as escadas e giraria a chave. Desfilaria pelo apartamento vazio, ligaria o chuveiro, a água escorreria pela pele e lavaria a alma. Sairia envolta pelo vapor e abriria a porta. Ele estaria lá. Seus olhos estariam tão transbordantes que a fariam chorar outra vez.
Mesmo seca, choveria de novo. Compraria um bloquinho e outro moletom. Novas roupas, mesmo cheiro. Mesmos hábitos, velho amor.
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